O Avesso do Céu (2023) conta, de forma ensaística, a história da exploração neocolonial nas áreas mais isoladas da Amazónia, na reserva indígena de Javari, na tríplice fronteira entre Brasil, Peru e Colômbia.

O filme entrelaça habilmente três esferas numa densa composição visual e acústica: a comunidade e cultura indígenas vibrantes, amantes da natureza, mas gravemente ameaçadas pela devastação da comunidade e da sua cultura, e cuja ameaça está sublinhada por um ritmo sustentado pelo bater dos sons de tambor ao mesmo ritmo do bater do coração. A indústria madeireira ilegal nos rios é ouvida através dos sons estridentes das serras elétricas para o corte da madeira; e a religião, com o proselitismo intrusivo das igrejas independentes evangélicas, com as sua missas, sermões e hinos da igreja, semelhantes a litanias que prometem o paraíso, e que culminam com o sacrifício ritual de um animal pelos membros da Asociación Evangélica de la Misión Israelita del Nuevo Pacto Universal, um movimento religioso originário no Peru que se estabeleceu do Altiplano na bacia do rio Javari na década de 1990, e que segue estritamente a interpretação do Antigo Testamento.

No final, o filme mostra a importância e o poder da religião como legitimadora e catalisadora do processo secular de colonização. A conquista de territórios está intimamente ligada à conquista e transformação de territórios mentais e da alma.